Juan Pantoja
Ninguém gosta do rico. Nem o próprio rico.

O Brasil é um país marcado por profundas desigualdades sociais, onde uma parcela significativa da população depende de políticas sociais e programas assistenciais para sobreviver. Esse cenário, embora necessário em muitos casos, criou um ciclo de dependência que muitas vezes desestimula a busca pela emancipação econômica. Em alguns casos extremos, há relatos de pessoas que querem ter mais filhos unicamente para receber mais bolsa família. Essa realidade, além de triste, é um reflexo de políticas públicas mal estruturadas e de um estado que não oferece as ferramentas necessárias para que essas pessoas encerrem o ciclo da pobreza.
Por outro lado, o país também desenvolveu uma cultura peculiar: a demonização do rico e dos herdeiros. Uma narrativa que frequentemente ganha destaque é a do “pobre que venceu”, um padrão que até os próprios ricos têm adotados para gerar empatia. Políticos e empresários costumam contar histórias de dificuldades passadas, reais ou exageradas, para conquistar o público. É assim que figuras como Silvio Santos, outra camelô, ou Pablo Marçal, que trabalhavam em um call center, são exaltadas como exemplos de superação. A ideia de que “ser rico só é aceitável se a riqueza foi conquistada a partir da pobreza” é amplamente difundida e perpetuada tanto pelas elites quanto pelas camadas populares.
Essa mentalidade, no entanto, cria uma falsa dicotomia entre "ricos legítimos" e "ricos de nascente". No Brasil, parecer simples – seja no discurso, nas vestimentas ou nos hábitos – é visto como uma virtude quase redentora. Essa percepção, infelizmente, não mede a capacidade de liderança, gestão ou sensibilidade social de uma pessoa, mas sim uma imagem criada para atender às expectativas do eleitorado.
Levando essa análise para o contexto local, a eleição municipal de 2024 em Porto Velho exemplifica essa dinâmica de forma clara. Mariana Carvalho, candidata à prefeitura, apresentou uma campanha robusta, com uma estrutura considerada "faraônica". Ainda assim, foi derrotado no segundo turno por Léo Moraes, cuja imagem pública foi cuidadosamente moldada para parecer mais "humilde" e "próxima do povo". A narrativa dominante era de um “Davi contra Golias”, com Léo representando o homem do povo, enquanto Mariana foi rotulada como candidata dos poderosos e da elite.
Curiosamente, os dois candidatos vieram de contextos privilegiados. Tanto Mariana quanto Léo foram criados em condições de conforto, em ambientes cercados por oportunidades. No entanto, a campanha de Léo conseguiu dissociá-lo do seu contexto social, enquanto Mariana foi amplamente criticada, com frases como "nunca trabalharam", "ricos de berço" e "nascidos em berço de ouro". Essa narrativa não partiu apenas das camadas mais pobres, mas também de indivíduos igualmente privilegiados, criando um cenário paradoxal: ricos criticando ricos pela mesma origem que compartilham.
Outro exemplo relevante é o de Márcio Coimbra, neto de Mário Português, dono das distribuidoras Coimbra. Durante sua candidatura a vereador em 2024, Márcio sofreu críticas semelhantes. Muitos torciam por sua derrota sob o argumento de que ele era um "playboy", alguém que "nunca trabalhou". O mais irônico, entretanto, é que essas críticas vieram, muitas vezes, de amigos que compartilham a mesma realidade social – indivíduos igualmente privilegiados que nunca precisaram enfrentar dificuldades significativas.
É evidente que começar do zero e conquistar coisas com esforço próprio sem apoio dos ascendentes é admirável. No entanto, a romantização da simplicidade e a demonização do privilégio podem ser competitivas. Ao focar em rótulos superficiais, como a vestimenta ou o passado financeiro de um candidato, corre-se o risco de perder de vista o que realmente importa: sua capacidade de liderança, competência e propostas para resolver os problemas reais da população.
Outro ponto importante é a relação de falsidade que muitas vezes permeia os círculos de pessoas privilegiadas. Os ricos, em sua maioria, são cercados por bajuladores, mas poucos são realmente leais. Muitas das pessoas que se aproximam o fazem buscando vantagens ou benefícios pessoais, enquanto, no íntimo, carregam inveja e até o desejo de que esses mesmos ricos enfrentem fracassos. Essa dinâmica cria um ambiente de aparência, onde nem sempre o apoio recebido é genuíno, mas sim interesseiro. É uma carga pesada que muitos levam para dentro de suas casas, cercada por pessoas que desejam mais explorar do que contribuir.
Esse comportamento reflete uma falha social maior: a incapacidade de lidar com o sucesso da forma saudável. Ao invés de admirar e aprender com quem possui mais recursos ou conquistas, muitos preferem nutrir ressentimentos e disseminar críticas, mesmo quando fazem parte do mesmo meio.
Essa cultura de "humildade performática" cria uma ilusão perigosa. A simplicidade no discurso ou no visual não garante que uma pessoa esteja mais conectada às demandas sociais. Da mesma forma, ser oriundo de uma família rica não desqualifica automaticamente alguém para ocupar cargas públicas ou tomar decisões em benefício da sociedade.
O foco deve ser menos em narrativas de origem e mais em propostas concretas e realizações práticas. Caso contrário, continuaremos presos em um ciclo onde a aparência mais importante do que a substância.
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